13 de maio de 2018

Questões de literatura com respostas (ENEM)

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01 - (ENEM/2011)

O nascimento da crônica
Há um meio certo de começar a crônica por uma trivialidade. É dizer: Que calor! Que desenfreado calor! Diz-se isto, agitando as pontas do lenço, bufando como um touro, ou simplesmente sacudindo a sobrecasaca. Resvala-se do calor aos fenômenos atmosféricos, fazemse algumas conjeturas acerca do sol e da lua, outras sobre a febre amarela, manda-se um suspiro a Petrópolis, e La glace est rompue; está começada a crônica.  
Mas, leitor amigo, esse meio é mais velho ainda do que as crônicas, que apenas datam de Esdras. Antes de Esdras, antes de Moisés, antes de Abraão, Isaque e Jacó, antes mesmo de Noé, houve calor e crônicas. No paraíso é provável, é certo que o calor era mediano, e não é prova do contrário o fato de Adão andar nu. Adão andava nu por duas razões, uma capital e outra provincial. A primeira é que não havia alfaiates, não havia sequer casimiras; a segunda é que, ainda havendo-os, Adão andava baldo ao naipe. Digo que esta razão é provincial, porque as nossas províncias estão nas circunstâncias do primeiro homem.

ASSIS, M. In: SANTOS, J .F. As cem melhores crônicas brasileiras.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2007 (fragmento).

Um dos traços fundamentais da vasta obra literária de Machado de Assis reside na preocupação com a expressão e com a técnica de composição. Em O nascimento da crônica, Machado permite ao leitor entrever um escritor ciente das características da crônica, como

a) texto breve, diálogo com o leitor e registro pessoal de fatos do cotidiano.
b) síntese de um assunto, linguagem denotativa, exposição sucinta.
c) linguagem literária, narrativa curta e conflitos internos.
d) texto ficcional curto, linguagem subjetiva e criação de tensões.
e) priorização da informação, linguagem impessoal e resumo de um fato.

02 - (ENEM/2012)

Cegueira
Afastou-me da escola, atrasou-me, enquanto os filhos de seu José Galvão se internavam em grandes volumes coloridos, a doença de olhos que me perseguia na meninice. Torturava-me semanas e semanas, eu vivia na treva, o rosto oculto num pano escuro, tropeçando nos móveis, guiando-me às apalpadelas, ao longo das paredes. As pálpebras inflamadas colavam-se. Para descerrá-las, eu ficava tempo sem fim mergulhando a cara na bacia de água, lavando-me vagarosamente, pois o contato dos dedos era doloroso em excesso. Finda a operação extensa, o espelho da sala de visitas mostrava-me dois bugalhos sangrentos, que se molhavam depressa e queriam esconder-se. Os objetos surgiam empastados e brumosos. Voltava a abrigar-me sob o pano escuro, mas isto não atenuava o padecimento. Qualquer luz me deslumbrava, feria-me como pontas de agulha [...].
Sem dúvida o meu espectro era desagradável, inspirava repugnância. E a gente da casa se impacientava. Minha mãe tinha a franqueza de manifestar-me viva antipatia. Dava-me dois apelidos: bezerro-encourado e cabra-cega.

RAMOS, G. Infância. Rio de Janeiro: Record, 1984 (fragmento).

O impacto da doença, na infância, revela-se no texto memorialista de Graciliano Ramos através de uma atitude marcada por

a) uma tentativa de esquecer os efeitos da doença.
b) preservar a sua condição de vítima da negligência materna.
c) apontar a precariedade do tratamento médico no sertão.
d) registrar a falta de solidariedade dos amigos e familiares.
e) recompor, em minúcias e sem autopiedade, a sensação da dor.

03 - (ENEM/2012)

TEXTO I

A canção do africano
Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
Junto ao braseiro, no chão,
entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão...
De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar...
E à meia-voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez p’ra não o escutar!
“Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o sol vem;
Esta terra é mais bonita,
Mas à outra eu quero bem.”

ALVES, C. Poesias completas.
Rio de Janeiro: Ediouro, 1995 (fragmento).

TEXTO II

No caso da Literatura Brasileira, se é verdade que prevalecem as reformas radicais, elas têm acontecido mais no âmbito de movimentos literários do que de gerações literárias. A poesia de Castro Alves em relação à de Gonçalves Dias não é a de negação radical, mas de superação, dentro do mesmo espírito romântico.

MELO NETO, J. C. Obra completa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003 (fragmento).

O fragmento do poema de Castro Alves exemplifica a afirmação de João Cabral de Melo Neto porque

a) exalta o nacionalismo, embora lhe imprima um fundo ideológico retórico.
b) canta a paisagem local, no entanto, defende ideais do liberalismo.
c) mantém o canto saudosista da terra pátria, mas renova o tema amoroso.
d) explora a subjetividade do eu lírico, ainda que tematize a injustiça social.
e) inova na abordagem de aspecto social, mas mantém a visão lírica da terra pátria.

04 - (ENEM/2012)

Sambinha

Vêm duas costureirinhas pela rua das Palmeiras.
Afobadas braços dados depressinha
Bonitas, Senhor! que até dão vontade pros homens da rua.
As costureirinhas vão explorando perigos...
Vestido é de seda.
Roupa-branca é de morim.
Falando conversas fiadas
As duas costureirinhas passam por mim.
— Você vai?
— Não vou não!
Parece que a rua parou pra escutá-las.
Nem trilhos sapecas
Jogam mais bondes um pro outro.
E o Sol da tardinha de abril
Espia entre as pálpebras sapiroquentas de duas nuvens.
As nuvens são vermelhas.
A tardinha cor-de-rosa.
Fiquei querendo bem aquelas duas costureirinhas...
Fizeram-me peito batendo
Tão bonitas, tão modernas, tão brasileiras!
Isto é...
Uma era ítalo-brasileira.
Outra era áfrico-brasileira.
Uma era branca.
Outra era preta.

ANDRADE, M. Os melhores poemas. São Paulo: Global, 1988.

Os poetas do Modernismo, sobretudo em sua primeira fase, procuraram incorporar a oralidade ao fazer poético, como parte de seu projeto de configuração de uma identidade linguística e nacional. No poema de Mário de Andrade esse projeto revela-se, pois

a) o poema capta uma cena do cotidiano — o caminhar de duas costureirinhas pela rua das Palmeiras — mas o andamento dos versos é truncado, o que faz com que o evento perca a naturalidade.
b) a sensibilidade do eu poético parece captar o movimento dançante das costureirinhas — depressinha — que, em última instância, representam um Brasil de “todas as cores”.
c) o excesso de liberdade usado pelo poeta ao desrespeitar regras gramaticais, como as de pontuação, prejudica a compreensão do poema.
d) a sensibilidade do artista não escapa do viés machista que marcava a sociedade do início do século XX, machismo expresso em “que até dão vontade pros homens da rua”.
e) o eu poético usa de ironia ao dizer da emoção de ver moças “tão modernas, tão brasileiras”, pois faz questão de afirmar as origens africana e italiana das mesmas.

05 - (ENEM/2012)

A escolha de uma forma teatral implica a escolha de um tipo de teatralidade, de um estatuto de ficção com relação à realidade. A teatralidade dispõe de meios específicos para transmitir uma cultura-fonte a um público-alvo; é sob esta única condição que temos o direito de falar em interculturalidade teatral.

PAVIS, P. O teatro no cruzamento de culturas. São Paulo: Perspectiva, 2008

A partir do texto, o meio especificamente cênico utilizado para transmitir uma cultura estrangeira implica

a) buscar nos gestos, compreender e explicitar conceitos ou comportamentos.
b) procurar na filosofia a tradução verdadeira daquela cultura.
c) apresentar o videodocumentário sobre a culturafonte durante o espetáculo.
d) eliminar a distância temporal ou espacial entre o espetáculo e a cultura-fonte.
e) empregar um elenco constituído de atores provenientes da cultura-fonte.

06 - (ENEM/2012)

— É o diabo!... praguejava entre dentes o brutalhão, enquanto atravessava o corredor ao lado do Conselheiro, enfiando às pressas o seu inseparável sobretudo de casimira alvadia. — É o diabo!
Esta menina já devia ter casado!
— Disso sei eu... balbuciou o outro. — E não é porfalta de esforços de minha parte; creia! — Diabo! Faz lástima que um organismo tão rico e tão bom para procriar, se sacrifique desse modo! 
Enfim — ainda não é tarde; mas, se ela não se casar quanto antes — hum... hum!... Não respondo pelo resto!
— Então o Doutor acha que...?
Lobão inflamou-se: Oh! o Conselheiro não podia imaginar o que eram aqueles temperamentozinhos impressionáveis!... eram terríveis, eram violentos, quando alguém tentava contrariá-los! Não pediam — exigiam — reclamavam!

AZEVEDO, A. O homem. Belo Horizonte: UFMG, 2003 (fragmento).

O romance O homem, de Aluísio Azevedo, insere-se no contexto do Naturalismo, marcado pela visão do cientificismo. No fragmento, essa concepção aplicada à mulher define-se por uma

a) conivência com relação à rejeição feminina de assumir um casamento arranjado pelo pai.
b) caracterização da personagem feminina como um estereótipo da mulher sensual e misteriosa.
c) convicção de que a mulher é um organismo frágil e condicionado por seu ciclo reprodutivo.
d) submissão da personagem feminina a um processo que a infantiliza e limita intelectualmente.
e) incapacidade de resistir às pressões socialmente impostas, representadas pelo pai e pelo médico.

07 - (ENEM/2012)

Todo bom escritor tem o seu instante de graça, possui a sua obra-prima, aquela que congrega numa estrutura perfeita os seus dons mais pessoais. Para Dias Gomes essa hora de inspiração veiolhe no dia que escreveu O pagador de promessas. Em torno de Zé-do-Burro — herói ideal, por unir o máximo de caráter ao mínimo de inteligência, naquela zona fronteiriça entre o idiota e o santo — o enredo espalha a malícia e a maldade de uma capital como Salvador, mitificada pela música popular e pela literatura, na qual o explorador de mulheres se chama inevitavelmente Bonitão, o poeta popular, Dedé Cospe-Rima, e o mestre de capoeira, Manuelzinho Sua Mãe. O colorido do quadro contrasta fortemente com a simplicidade da ação, que caminha numa linha reta da chegada de Zé-do-Burro à sua entrada trágica e triunfal na igreja — não sob a cruz, conforme prometera, mas sobre ela, carregado pelos capoeiras, “como um crucifixado”.

PRADO, D. A. O teatro brasileiro moderno. São Paulo: Perspectiva, 2008 (fragmento).

A avaliação crítica de Décio de Almeida Prado destaca as qualidades de O pagador de promessas. Com base nas ideias defendidas por ele, uma boa obra teatral deve

a) valorizar a cultura local como base da estrutura estética.
b) ressaltar o lugar do oprimido por uma forma religiosa.
c) dialogar a tradição local com elementos universais.
d) romper com a estrutura clássica da encenação.
e) reproduzir abordagens trágicas e pessimistas.

08 - (ENEM/2013)

Meu povo, meu poema
Meu povo e meu poema crescem juntos
Como cresce no fruto
A árvore nova
No povo meu poema vai nascendo
Como no canavial
Nasce verde o açúcar
No povo meu poema está maduro
Como o sol
Na garganta do futuro
Meu povo em meu poema
Se reflete
Como espiga se funde em terra fértil
Ao povo seu poema aqui devolvo
Menos como quem canta
Do que planta

FERREIRA GULLAR. Toda poesia. José Olympio: Rio de Janeiro, 2000.

O texto Meu povo, meu poema, de Ferreira Gullar, foi escrito na década de 1970. Nele, o diálogo com o contexto sociopolítico em que se insere expressa uma voz poética que

a) precisa do povo para produzir seu texto, mas se esquiva de enfrentar as desigualdades sociais.
b) dilui a importância das contingências políticas e sociais na construção de seu universo poético.
c) associa o engajamento político à grandeza do fazer poético, fator de superação da alienação do povo.
d) afirma que a poesia depende do povo, mas esse nem sempre vê a importância daquela nas lutas de classe.
e) reconhece, na identidade entre o povo e a poesia, uma etapa de seu fortalecimento humano e social.

09 - (ENEM/2014)

Soneto
Oh! Páginas da vida que eu amava,
Rompei-vos! nunca mais! tão desgraçado!...
Ardei, lembranças doces do passado!
Quero rir-me de tudo que eu amava!
E que doido que eu fui! como eu pensava
Em mãe, amor de irmã! em sossegado
Adormecer na vida acalentado
Pelos lábios que eu tímido beijava!
Embora — é meu destino. Em treva densa
Dentro do peito a existência finda
Pressinto a morte na fatal doença!
A mim a solidão da noite infinda!
Possa dormir o trovador sem crença.
Perdoa minha mãe – eu te amo ainda!

AZEVEDO, A. Lira dos vinte anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

A produção de Álvares de Azevedo situa-se na década de 1850, período conhecido na literatura brasileira como Ultrarromantismo. Nesse poema, a força expressiva da exacerbação romântica identifica-se com o (a)

a) amor materno, que surge como possibilidade de salvação para o eu lírico.
b) saudosismo da infância, indicado pela menção às figuras da mãe e da irmã.
c) construção de versos irônicos e sarcásticos, apenas com aparência melancólica.
d) presença do tédio sentido pelo eu lírico, indicado pelo seu desejo de dormir.
e) fixação do eu lírico pela ideia da morte, o que o leva a sentir um tormento constante.

TEXTO: 1 - Comum à questão: 10

Texto I

[...] já foi o tempo em que via a convivência como viável, só exigindo deste bem comum, piedosamente, o meu quinhão, já foi o tempo em que consentia num contrato, deixando muitas coisas de fora sem ceder contudo no que me era vital, já foi o tempo em que reconhecia a existência escandalosa de imaginados valores, coluna vertebral de toda ‘ordem’; mas não tive sequer o sopro necessário, e, negado o respiro, me foi imposto o sufoco; é esta consciência que me libera, é ela hoje que me empurra, são outras agora minhas preocupações, é hoje outro o meu universo de problemas; num mundo estapafúrdio — definitivamente fora de foco — cedo ou tarde tudo acaba se reduzindo a um ponto de vista, e você que vive paparicando as ciências humanas, nem suspeita que paparica uma piada: impossível ordenar o mundo dos valores, ninguém arruma a casa do capeta; me recuso pois a pensar naquilo em que não mais acredito, seja o amor, a amizade, a família, a igreja, a humanidade; me lixo com tudo isso! me apavora ainda a existência, mas não tenho medo de ficar sozinho, foi conscientemente que escolhi o exílio, me bastando hoje o cinismo dos grandes indiferentes [...].

NASSAR, R. Um copo de cólera. São Paulo:
Companhia das Letras, 1992.

Texto II

Raduan Nassar lançou a novela Um Copo de Cólera em 1978, fervilhante narrativa de um confronto verbal entre amantes, em que a fúria das palavras cortantes se estilhaçava no ar. O embate conjugal ecoava o autoritário discurso do poder e da submissão de um Brasil que vivia sob o jugo da ditadura militar.

COMODO, R. Um silêncio inquietante. IstoÉ. Disponível em:
http://www.terra.com.br. Acesso em: 15 jul. 2009.

10 - (ENEM/2009)

Considerando-se os textos apresentados e o contexto político e social no qual foi produzida a obra Um Copo de Cólera, verifica-se que o narrador, ao dirigir-se à sua parceira, nessa novela, tece um discurso

a) conformista, que procura defender as instituições nas quais repousava a autoridade do regime militar no Brasil, a saber: a Igreja, a família e o Estado.
b) pacifista, que procura defender os ideais libertários representativos da intelectualidade brasileira opositora à ditadura militar na década de 70 do século passado.
c) desmistificador, escrito em um discurso ágil e contundente, que critica os grandes princípios humanitários supostamente defendidos por sua interlocutora.
d) politizado, pois apela para o engajamento nas causas sociais e para a defesa dos direitos humanos como uma única forma de salvamento para a humanidade.
e) contraditório, ao acusar a sua interlocutora de compactuar com o regime repressor da ditadura militar, por meio da defesa de instituições como a família e a Igreja.

GABARITO
1A
2E
3E
4B
5A
6C
7C
8E
9E
10C