15 de novembro de 2016

Exercícios poema Não te amo de Almeida Garrett (Romantismo em Portugal)


Leia o texto a seguir. 

Não te amo 
Neste poema, o eu lírico explora uma das dualidades básicas da estética romântica. 

Não te amo, quero-te: o amor vem d'alma. 
E eu n'alma  tenho a calma, 
A calma  do jazigo
Ai! não te amo, não. 

Não te amo, quero-te: o amor é vida. 
E a vida  nem sentida 
A trago eu já comigo. 
Ai, não te amo, não! 

Ai! não te amo, não; e só te quero 
De um querer bruto e fero 
Que o sangue me devora, 
Não chega ao coração. 

Não te amo. És bela; e eu não te amo, ó bela. 
Quem ama a aziaga estrela 
Que lhe luz na má hora 
Da sua perdição? 

E quero-te, e não te amo, que é forçado, 
De mau feitiço azado 
Este indigno furor. 
Mas, oh! Não te amo, não. 

E infame sou, porque te quero; e tanto 
Que de mim tenho espanto 
De ti medo e terror... 
Mas amar!... não te amo, não. 

ALMEIDA GARRETT. Folhas caídas. Porto: Porto Editora, s. d. p.40. [Coleção Clássicos da Literatura Portuguesa). Biblioteca digital. 
Disponível em: <http://www.portoeditora.pt/bdigital/default.asp?param=08020100>Acesso em:11 dez.2009

Jazigo: sepultura. 
Fero: sanguinário, violento, cruel. 
Aziaga: de má sorte, de mau agouro. 

1. No primeiro verso o eu lírico estabelece uma oposição que irá desenvolver ao longo do poema. Que oposição é essa? 
> Pelo tema do poema, é possível fazer uma imagem do interlocutor a quem o eu lírico se dirige. Que interlocutor seria esse? Explique. 

2. Ao longo do poema, o eu lírico utiliza diferentes imagens para definir o amor. Quais são elas? 
> Que argumento é apresentado, na primeira estrofe, como demonstração de que o sentimento do eu lírico não pode ser identificado como amor? 

3. Também o querer é associado a imagens diversas, ao longo do poema. Quais são elas? 
> Qual é o sentido básico dessas imagens? Por quê? 

4. Podemos identificar, ao longo do poema, a história de um drama individual, de gosto bem romântico. Que drama seria esse? 
> Por que a oposição amor x querer ajuda a reforçar a ideia do amor como um dos principais valores românticos? 

Gabarito

1. A oposição entre amor e querer. 
> Como o eu lírico se preocupa em deixar claro que aquilo que sente é querer e não amor, pode-se imaginar que o seu interlocutor seja a mulher que desperta esse querer. Isso fica claro na declaração inicial: "Não te amo, quero-te". 

2. O amor é apresentado como um sentimento que vem da alma e, em seguida, como sendo sinônimo de vida. 
> Segundo o eu lírico, o amor vem da alma e, como na sua alma ele tem a "calma do jazigo" (ou seja, não há qualquer sentimento que agite a sua alma, ela se encontra tão calma como um túmulo), não pode estar vivendo um amor. Na segunda estrofe, quando associa o amor à vida, o eu lírico reafirma a impossibilidade de estar amando, já que a vida "nem sentida! A trago eu já comigo". 

3. O querer é apresentado como um sentimento bruto e fero, como algo que devora o sangue, como uma estrela de mau agouro que brilha no momento da perdição, como um furor, como algo que desperta medo e terror. 
> Todas as imagens associadas ao querer têm conotação negativa. A mais forte delas o apresenta como uma estrela de mau agouro que brilha no momento da perdição do indivíduo. O querer, quando toma conta de um indivíduo, portanto, é capaz de determinar um destino negativo, de tristeza e destruição. 

4. O drama individual é vivido pelo eu lírico, que se confessa vítima de um querer incontrolável. Apesar e e e apresentar vários argumentos que identificam o querer como um sentimento negativo, não parece conseguir livrar-se desse fogo que lhe devora o sangue e faz com que sinta "medo e terror" da mulher capaz de aprisioná-lo de modo tão violento. A luta interna entre o sentimento desejado - o amor - e o indesejado - o querer - é um dos temas muito explorados pelos poetas românticos. 
> O poema explora a ideia romântica de que o amor é um sentimento nobre, algo que traz vida, calma e promove uma certa purificação do indivíduo. O querer, por outro lado, nasce dos desejos carnais, provoca descontrole, faz com que o indivíduo se veja "prisioneiro" do objeto de seu desejo. O poema de Garrett pode ser visto, nesse sentido, como um manifesto contra o desejo, já que o eu lírico passa todo o tempo lutando contra o querer que o aprisiona.