Este inferno de amar
Este inferno de amar - como eu amo! -
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há de apagar?
Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?
Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...
GARRETT, Almeida. Este inferno de amar. In: MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. 14. ed. São Paulo: Cultrix, 1985. p. 219.
QUESTÕES DE INTERPRETAÇÃO
1. A que episódio da biografia de Garrett parece estar associado o poema?
2. A qual característica romântica corresponde a associação entre biografia e obra?
3. O poema exprime a confusão dos sentimentos do amante.
a) Comente, a esse respeito, o título do poema.
b) Localize na primeira estrofe dois oximoros (paradoxos) que exprimem a confusão dos sentimentos.
4. O sujeito lírico evoca o tempo em que o amor era apenas um sonho. Os olhos de uma mulher despertaram-no, tornando o sonho realidade.
a) Qual é a diferença entre o sonho e a realidade do amor?
b) Apesar dessa diferença, o poema termina com uma defesa do amor. Explique.
GABARITO
1. O poema parece estar associado ao caso amoroso de Garrett com a Viscondessa da Luz.
2. Corresponde ao confessionalismo, à preocupação em produzir uma obra lírica que seja a expressão sincera dos sentimentos do autor.
3.
a) O título já exprime as contradições do sentimento, que é o tema do poema: o amor, condição da felicidade, é causa de sofrimentos é um verdadeiro inferno para o sujeito lírico.
b) "Esta chama que alenta e consome," e "Que é a vida - e que a Vida destrói -".
4.
a) O sonho era doce e nele havia a paz; a realidade é o sofrimento, o "inferno".
b) Apesar dos sofrimentos que causa, o amor é a condição da Vida; o sujeito lírico afirma que só começou a viver quando o amor o despertou.